quarta-feira, 14 de abril de 2010

VISÃO DO SOCIAL ESPIRITA

Espiritismo e Evangelho

1. Diz-nos Emmanuel: "O Espiritismo, sem Evangelho, pode alcançar as melhores expressões de nobreza, mas não passará de atividade desti¬nada a modificar-se ou desaparecer, como todos os elementos transitó¬rios do mundo. E o espírita, que não cogitou da sua iluminação com Je¬sus Cristo, pode ser um cientista e um filósofo, com as mais elevadas aquisições intelectuais, mas estará sem leme e sem roteiro no instante da tempestade inevitável da provação e da experiência, porque só o sentimento divino da fé pode arrebatar o homem das preocupações infe¬riores da Terra para os caminhos supremos dos páramos espirituais" (O Consolador, item 236).

2. Aludindo ao ensino moral contido no Evangelho, Allan Kardec pondera: "Diante desse código divino, a própria incredulidade se curva. É o terreno em que todos os cultos podem encontrar-se, a bandeira sob a qual todos podem abrigar-se, por mais diferentes que sejam as suas crenças. Porque nunca foi objeto de disputas religiosas, sempre e por toda parte provocadas pelos dogmas. Se o discutissem, as seitas te¬riam, aliás, encontrado nele a sua própria condenação, porque a maio¬ria delas se apegou mais à parte mística do que à parte moral, que exige a reforma de cada um. Para os homens, em particular, é uma regra de conduta, que abrange todas as circunstâncias da vida privada e pú¬blica, o princípio de todas as relações sociais fundadas na mais rigo¬rosa justiça. É, por fim, e acima de tudo, o caminho infalível da fe¬licidade a conquistar, uma ponta do véu erguida sobre a vida futura" (O Evangelho segundo o Espiritismo, Introdução, item I).

3. Diante de tais ensinamentos, não se concebe falar em assistên¬cia social espírita sem evangelização, porquanto ensinar a Doutrina Espírita direcionando o indivíduo para a prática dos ensinos do Cristo é favorecer-lhe o caminho da felicidade. Existe objetivo mais nobre do que esse? O objetivo da assistência social espírita não é, portanto, como muitos pensam, tão-somente saciar corpos perecíveis, mas iluminar consciências, formar indivíduos saudáveis do ponto de vista físico, psicológico e espiritual, fazer homens de bem, porque "o homem que se ilumina conquista a ordem e a harmonia para si mesmo" (O Consolador, item 234).

O Serviço Social no plano espiritual

4. A assistência social espírita, que constitui, na história do movimento espírita brasileiro, um dos capítulos mais fecundos, não se limita ao plano dos encarnados, porque essa preocupação é freqüente também nas províncias espirituais adjacentes à Crosta. Diz Lúcia Lou¬reiro (in "Colônias Espirituais", pág. 43): "Nas Colônias Espirituais, o Serviço Social possui um vasto campo de ação no desenvolvimento das atividades. Desde as entrevistas iniciais até o encaminhamento em ex¬cursões para estudo e observação. Os Espíritos instrutores empregam fórmulas variadas com os recém-desencarnados a depender de suas carac¬terísticas e reações. O Amor e a Tolerância são fundamentais, e o Es¬pírito que recepciona o que chega emprega toda a habilidade psicoló¬gica para que este se sinta seguro e aceito, apesar de suas imper¬feições. O Espírito recepcionista tem muita precaução nos contatos com o recém-desencarnado, atentando para a sua sensibilidade ao comentar erros passados, estimulando-o sem pressão".

5. Lúcia Loureiro acrescenta: "Esses Assistentes Sociais do Es¬paço integram as Caravanas Socorristas e são elementos preparados para fazer a aproximação daqueles que já se acham em condições razoáveis para recebimento de socorro. Outros há que fazem as visitas periódicas ao `enfermo', a fim de estimulá-lo a elevar o padrão vibratório, a es¬clarecê-lo... Eles acompanham os assistidos por toda a sua estada nas Colônias, observado o progresso espiritual de cada um".

6. As tarefas auxiliares do Serviço Social são o socorro espiri¬tual e a reabilitação:

Socorro espiritual: "Por ocasião das visitas das Caravanas Socor¬ristas às zonas inferiores, a primeira ajuda oferecida aos Espíritos carentes é a sua retirada do local e o transporte para as instituições hospitalares das Colônias. Após a fase de perturbação, os Espíritos, ainda exauridos, não têm forças para se locomover nem o senso da dire¬ção, daí a necessidade de transportá-los em macas, da mesma forma que os nossos doentes terrestres." Essa providência equivaleria, em nosso meio, a dar o peixe a quem tem fome.

Reabilitação: "Nas Colônias, o valioso instrumento de reabilita¬ção do Espírito é o trabalho, utilizado, também, como terapia ocupa¬cional. À medida que o Espírito convalescente se interessa pelo ser¬viço da comunidade, dedicando-se a qualquer tarefa, ainda que a mais simples, vai, da mesma forma, concretizando a sua cura. Os Espíritos comunicantes são unânimes quanto a essas declarações".

7. Em "A Vida Além do Véu”, o Rev. G. Vale Owen fala dessas ativida¬des, e André Luiz descreve em "Nosso Lar" a sua própria experiência: "Narcisa fazia o possível por atender prontamente à tarefa de limpeza, mas debalde. Grande número deles deixava escapar a mesma substância negra e fétida. Foi então que, instintivamente, me agarrei aos petre¬chos de higiene e lancei-me ao trabalho com ardor. A servidora parecia contente com o auxílio humilde do novo irmão, ao passo que Tobias me dispensava olhares satisfeitos e agradecidos. O serviço continuou por todo o dia, custando-se abençoado suor, e nenhum amigo do mundo pode¬ria avaliar a alegria sublime do médico que recomeçava a educação de si mesmo, na enfermagem rudimentar" ("Nosso Lar", cap. 27, pág. 151).

8. Otília Gonçalves (Espírito), em "Além da Morte", relata: “Aclimatada, na Terra, aos labores humildes de limpeza e asseio, ofe¬reci-me à irmã Zélia, em dia de grande movimento, para contribuir de algum modo com os deveres de manutenção da Enfermaria onde me encon¬trava, experimentando, com a sua aquiescência, indizível júbilo. À me¬dida que era atraída para esse serviço singelo, estranho revigoramento tomava corpo dentro de mim, entusiasmando-me e fazendo-me esquecer as preocupações e angústias lancinantes que ficaram no espírito, com a distância colocada pela morte”. Adrião lhe disse então que "o tra¬balho é o poderoso elixir de longa vida que fortifica todas as espe-ranças e esponja que apaga todas as preocupações. A alma que labora não é colhida pelas malhas das tentações da dúvida e do medo, ficando distante do barco fraco dos receios".

As organizações socorristas da erraticidade

9. Verifica-se, assim, que no Além a ociosidade e a inércia não têm lugar para aqueles que sentem a necessidade de progredir. Só a de¬dicação abnegada ao bem-estar geral faz com que se ascenda aos Planos Superiores. Os demais lá chegarão também, mas apenas pela dor.

10. A série "Nosso Lar", escrita por André Luiz, nos permitiu co¬nhecer inúmeras dessas organizações socorristas existentes nos planos espirituais imediatos à Crosta da Terra, de que fala Lúcia Loureiro:

O "Samaritanos" é uma delas, com notável atividade junto ao Um¬bral ("Nosso Lar", cap. 28, pág. 152).

O Posto de Socorro vinculado à colônia "Campo da Paz", adminis¬trado por Alfredo, com cerca de 500 cooperadores, é outra ("Os Mensa¬geiros", cap. 15 e 16).

Em "Obreiros da Vida Eterna" (cap. IV), André alude à Casa Tran¬sitória de Fabiano e às suas congêneres Oratório de Anatilde e Funda¬ção Cristo.

Em "No Mundo Maior" (cap. 20) fala-nos do Lar de Cipriana e dos inúmeros Postos de Socorro e Escolas (cap. 17) que atendem às en¬tidades sofredoras situadas numa várzea de extensão imensa localizada no limiar das cavernas, onde "vastos cardumes de desventurados jaziam chumbados ao solo, quais aves desditosas, de asas partidas".

No livro "Entre a Terra e o Céu" (cap. XI) descreve o Lar da Bênção, onde mais de 2.000 crianças desencarnadas são assistidas por mães substitutas, a maioria à espera de uma nova oportunidade no plano terrestre.

E em "Ação e Reação" (cap. 1) André nos apresenta a "Mansão Paz", instituição socorrista vinculada à colônia Nosso Lar, fundada há mais de três séculos para atendimento a entidades infelizes e enfermas que se preparam para nova incursão na experiência terrestre.

Cinco pontos fundamentais do Serviço Social espírita

11. Das experiências e relatos constantes da série Nosso Lar, de André Luiz, podemos extrair os seguintes pontos, que nos parecem fun¬damentais a um trabalho de assistência social espírita:

1o) A prática do bem é mero dever: "O Evangelho de Jesus (disse a André aquela que foi sua mãe terrena) lembra-nos que há maior alegria em dar que em receber. (...) Dá sempre, filho meu. Sobretudo, jamais esqueças dar de ti mesmo, em tolerância construtiva, em amor fraternal e divina compreensão.
A prática do bem exterior é um ensinamento e um apelo, para que cheguemos à prática do bem interior.

Jesus deu mais de si, para o engrandecimento dos homens, que todos os milionários da Ter¬ra congregados no serviço, sublime embora, da caridade material. Não te envergonhes de amparar os chaguentos e esclarecer os loucos que penetrem as Câmaras de Retificação (...). Trabalha, meu filho, fazendo o bem. Sempre que possas, olvida o entretenimento e busca o serviço útil" (Nosso Lar, cap. 36, pág. 198).

2o) O bem que fazemos jamais fica esquecido: "Nos círculos infe¬riores, meu filho (disse-lhe sua mãe), o prato de sopa ao faminto, o bálsamo ao leproso, o gesto de amor ao desiludido, são serviços divi¬nos que nunca ficarão deslembrados na Casa de Nosso Pai" (Idem, pág. 197).

3o) Não se concebe o trabalho de ajuda ao próximo sem o espírito de fraternidade: "Ainda há pouco tempo (disse-lhe Laura, mãe de Lí¬sias) ouvi um grande instrutor no Ministério da Elevação assegurar que, se pudesse, iria materializar-se nos planos carnais, a fim de di¬zer aos religiosos, em geral, que toda caridade, para ser divina, pre¬cisa apoiar-se na fraternidade" (Nosso Lar, cap. 39, pág. 218).

4o) O padrão da obra socorrista no mundo será sempre Jesus: "Jesus (disse-lhe Vicente, que também fora médico na Terra) não foi somente o Mestre, foi Médico também. Deixou no mundo o padrão da cura para o Reino de Deus. Ele proporcionava socorro ao corpo e ministrava fé à alma. Nós, porém, meu caro André, em muitos casos terrestres, nem sempre aliviamos o corpo e quase sempre matamos a fé" (Os Mensageiros, cap. 13, pág. 74).

5o) Devemos dar o pão que alimente o corpo, sem esquecer a luz que ilumine o espírito: "Nos primórdios do Cristianismo (disse-lhe Irene), a maioria dos necessitados entraria em contacto com Jesus através da sopa humilde ou do teto acolhedor. Lavando leprosos, tra¬tando loucos, assistindo órfãos e velhinhos desamparados, os continua¬dores do Cristo davam trabalho a si próprios, dedicavam-se aos infeli¬zes, esclarecendo-lhes a mente, e ofereciam lições de substancial in¬teresse aos leigos da fé viva. Como não ignoram, estamos fazendo no Espiritismo evangélico a recapitulação do Cristianismo" (Obreiros da Vida Eterna, cap. XII, pág. 190).

A recomendação de São Francisco Xavier

12. Conta-nos Manoel Philomeno de Miranda (in "Tramas do Des¬tino", cap. 21, págs. 196 a 199, obra psicografada por Divaldo P. Franco) que, quando o Centro Espírita "Francisco Xavier", de Salvador (BA), teve a sua edificação planejada, o dirigente espiritual Natércio, profundo admirador e discípulo de São Francisco Xavier, que fora na Terra incansável propagandista da fé cristã, tendo-a levado ao Japão, China e Índia, nos idos do séc. XVI, recorreu ao fiel Apóstolo de Jesus, suplicando seu patrocínio espiri¬tual para a Casa que seria erguida. Recebido pelo Mensageiro do Se¬nhor, Natércio expôs-lhe o programa que objetivava realizar. Sua grande meta era incrementar entre os homens o ardor da fé e a pureza dos princípios morais, conforme as regras simples dos "seguidores do Caminho", sem os atavios do dogmatismo, da aparência e dos formalis¬mos.

13. Terminado seu relato, o instrutor recebeu o aval do insigne Mis¬sionário, com uma condição: que se preservasse ali o Evangelho em suas linhas puras e simples, num clima de austeridade moral e serviços ilu¬minativos disciplinados, com os resultantes dispositivos para a cari-dade na suas múltiplas expressões, tendo-se, porém, em vista que os socorros materiais seriam decorrência natural do serviço espiritual, prioritário, imediato, e não os preferenciais..." "Não deveriam es¬quecer-se de que a maior carência ainda é a do pão de luz da consola¬ção moral, que o Livro da Vida propicia fartamente..."

14. Comentando o episódio, assevera Manoel Philomeno de Miranda (obra citada, págs. 198 e 199):

"Pensa-se muito em estômagos a saciar, cor¬pos a cobrir, doenças a curar... Sem menosprezar-lhes a urgência, o Consolador tem por meta primacial o espírito, o ser em sua realidade imortal, donde procedem todas as conjunturas e situações, que se exte¬riorizam pelo corpo e mediante os contingentes humanos, sociais, ter¬renos, portanto...

"A assistência social no Espiritismo é valiosa, no entanto, se precatem os `trabalhadores da última hora' contra os excessos, a fim de que a exaustão com os labores externos não exaura as forças do en¬tusiasmo nem derrube as fortalezas da fé, ao peso da extenuação e do desencanto nos serviços de fora.

"Evangelizar, instruir, guiar, colocando o azeite na lâmpada do coração, para que a claridade do espírito luza na noite do sofrimento, são tarefas urgentes, basilares na reconstrução do Cristianismo".

Não basta dar o pão que alimente apenas o corpo

15. É por isso que Joanna de Ângelis nos propõe (in "Dimensões da Verdade", pág. 123):

"A caridade tem regime de urgência, mas também o esclarecimento ao seu lado tem tarefa prioritária, funcionando como combustível de sustentação.

"Pão ao esfaimado como dever imediato, e luz do ensino espírita, para que a angústia da fome seja dirimida pelo serviço dignificante.

"Tecidos ao corpo entanguido como tarefa inadiável; no entanto, orientação espírita para agasalhar a alma na esperança, livrando-a, em definitivo, do frio.

"Medicamento ao corpo doente como recurso urgente; todavia, dire¬triz espírita para que o espírito compreenda as razões profundas da dor e possa revitalizar-se.

"Socorro ao aflito nos braços do desespero como obrigação irre¬sistível; mas roteiro espírita para que o conhecimento o liberte de toda treva e agitação.

"Amparo ao órfão, no próprio lar, como lição viva de amor; porém, conduta espírita diante dele, como linha de segurança para o seu en¬grandecimento.

"Assistência à mulher viúva e auxílio à miséria como impositivo da ação cristã; todavia, oferta da Doutrina Espírita a fim de que a revolução da verdade conceda luz e vida, para que novos enganos sejam evitados, libertando as mentes das ligações poderosas com o mal.

E a nobre mártir do Cristianismo nascente, hoje orientadora espiritual do trabalho de Divaldo P. Franco, arremata (obra citada, pág. 50):

"Nem Espiritismo sem assistência social, nem assistência social sem Espiritismo, para nós espiritistas encarnados e desencarnados.

"E guardemos a certeza de que, ao lado da assistência material que possamos doar, a assistência moral e espiritual deve ter prima¬zia."

P.Moryah.


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